Quem vem acompanhando as notícias relacionadas à gestão da coisa pública, se surpreendeu no início do mês de dezembro com a notícia de que a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que altera a Lei de Responsabilidade Fiscal1.
Desde 2000, com a entrada em vigor da Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), foram estabelecidos limites de gastos com pessoal visando maior equilíbrio nas finanças públicas. Conforme descrito na referida norma, o ente que estourar o limite de gasto, e não se adequar durante o prazo de dois quadrimestres, será impedido de receber transferências voluntárias, obter garantia e contratar operações de crédito.
À primeira vista, essa alteração pode abrir espaço para a irresponsabilidade dos prefeitos em relação ao controle de gastos.
No início do ano2 esse assunto estava descartado da pauta do governo, mas parece que voltou a todo vapor agora.
Mas… Porque ela é tão importante?
A Lei de Responsabilidade Fiscal possui 3 regras fiscais em vigor, regras que os governos devem(riam) obedecer para equilibrar as contas e estabilizar as suas dívidas. A mais conhecida é a regra de ouro, mecanismo que faz parte do texto constitucional (artigo 167) que proíbe que os governos em suas esferas façam dívidas para pagar despesas correntes, como salários dos servidores e aposentadorias. As outras são o teto de gastos (pelo qual as despesas primárias não podem crescer acima da inflação do ano anterior) e a meta de resultado primário, obtida pela diferença entre receitas e despesas primárias. Quando a diferença resulta em uma sobra de recursos (superávit), é usada para abater juros da dívida pública.
A intenção da lei é proteger as gerações futuras e o país de um superendividamento já dos governos.
O projeto que altera a Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe punição aos municípios que tiverem uma queda de mais de 10% de suas receitas caso ultrapassem o limite de gastos com pessoal de 60% (Na esfera federal, o limite máximo para gastos com pessoal é de 50% da receita corrente líquida. Para estados e municípios, o limite é de 60% da RCL, o que eu já considero alto demais).
Mesmo com a Lei de Responsabilidade Fiscal em vigor sem alteração, temos acompanhado casos de Estados3 e Municípios com problemas fiscais e as consequências que isso tem trazido ao provimento de serviços públicos.
Um fator que chama atenção na proposta é que essa “flexibilização” só tem validade nos casos de redução de repasses do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) ou royalties e participações especiais. Desta forma, ligados à fatores externos, alheios à administração.
Nas minhas andanças por municípios pelo país, e em pesquisas feitas pelo FIRJAN, é possível constatar que a maior parte das receitas das cidades com menos de 20 mil habitantes é constituída de repasses federais (FPM) e estaduais (FPE).
Fonte: Firjan
Aqui é que mora o risco. A questão que fica é que sendo esse projeto sancionado, serveria de incentivo para que prefeitos e governadores não façam esforços para uma boa gestão fiscal.
Os governos precisam encarar a realidade das contas públicas e cortar privilégios e desperdícios, e a sociedade participar ativamente do controle social. A despesa pública precisa se encaixar na arrecadação de tributos e respeitar os limites, no mínimo, para que sobre recursos para o atendimento de suas prioridades.
E aí? O que você acha? Qual a saída?
Referências:
- https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/12/camara-aprova-fim-de-punicao-para-municipios-que-estourarem-limite-de-gasto-com-pessoal.shtml
- https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/01/1948856-discussao-sobre-regra-de-ouro-nao-e-adequada-para-o-momento-diz-meirelles.shtml
- https://g1.globo.com/economia/noticia/2018/11/13/14-estados-superam-limite-da-lrf-para-gastos-com-pessoal-em-2017-diz-tesouro-nacional.ghtml